Lendo a obra Antologia de Crônicas, de Lima Barreto, organizada por Mario Higa, deparei-me com alguns fatos aludidos pelo escritor relativos à política e aos políticos brasileiros.
Gabriel García Márquez escreveu Cem anos de solidão, narrando uma saga familiar. Eu, modestamente, escrevo “Cem anos de esculhambação” na saga dos políticos neste país.
Numa das crônicas, Lima Barreto reclamou da procrastinação para solucionar os transtornos causados pelas inundações decorrentes das chuvas de verão que acontecem no Rio de Janeiro. Lima até mencionou o nome do prefeito da época em que escreveu a crônica - um tal de Passos.
E o que vemos anualmente nos noticiários do início de ano ? As mesmas desgraças que já ocorriam em 1915, há quase cem anos, quando foi escrita a crônica.
Com todo o desconto dado pelo mau comportamento da população em insistir em morar em áreas de risco sujeitas às inundações, entre outras coisas, percebe-se, ainda, o descaso e despreparo do estado e das autoridades públicas em lidar e/ou solucionar o problema.
Entra prefeito sai prefeito; entra governador sai governador, e nenhum até hoje solucionou a questão do Lima Barreto e dos irmãos cariocas.
Noutra crônica, Lima Barreto assim escreveu: “Não gosto, nem trato de política. Não há assunto que mais me repugne do que aquilo que se chama habitualmente política. Eu a encaro, como todo o povo a vê, isto é, um ajuntamento de piratas mais ou menos diplomados que exploram a desgraça e a miséria dos humildes”. Sábias palavras, eu diria.
Disse ainda o ilustre cronista: “A república no Brasil é o regime da corrupção”. Falou também da “verba secreta” e que todos querem “comer”, e que o “O Brasil é uma vasta comilança”.
Tudo isso foi escrito em 1918, sobre a realidade da política brasileira naquela época, na visão do Lima Barreto. De novo, ressalto: há quase cem anos.
Pergunto: mudou alguma coisa de lá para nossos dias? Não. Se mudou, foi pra pior. Nunca foi tão atual a frase de Lima Barreto “A república no Brasil é o regime da corrupção”. É só acompanhar a mídia sobre os casos de corrupção denunciados semanalmente.
E os caras de pau de 1915, 1918, devem ter encarnado com todos os seus demônios nos caras de pau de hoje em dia.
Pobre Lima Barreto! Lá do além, do paraíso, seja lá de onde for, deve continuar se indignando com a pirataria (como ele mesmo chamou), que ainda está enraizada na política brasileira.
E pior, na sua cidade natal, a bela Rio de Janeiro, brevemente estará instalado, se é que já não o foi, o próximo covil para desviar as verbas destinadas às obras para as Olimpíadas de 2016. De lambujem, ainda tem a Copa de 2014; ou a lambujem seriam as Olimpíadas? Alguém duvida?!
Juscelino Nery
Enviado por Juscelino Nery em 18/08/2011